Análise da Diversidade e Caracterização das Síndromes de Dispersão de Diásporos em um Gradiente Sucessional de Caatinga Hiperxerófila

Iara Alves de Lavôr1*, Daniela Tábita de Lavôr2, Camila Silva de Lavôr3 e Dan Vitor Vieira Braga1

Recebido em 04/02/2022 – Aceito em 14/09/2023

1 Faculdade de Ciências Humanas do Sertão Central/FACHUSC. Brasil. <yarahlavor@hotmail.com, bragadvv@gmail.com>.

* Contato principal.

2 Secretaria de Educação de Pernambuco. Brasil. <danielalavor@hotmail.com>.

3 Universidade Federal do Vale do São Francisco/UNIVASF. Brasil. <csilvadelavor@gmail.com>.

RESUMO A dispersão de sementes refere-se à retirada ou liberação dos diásporos da planta de origem e permite que frutos e/ou sementes escapem de serem depositados nas proximidades desse vegetal, onde as taxas de mortalidade são altas. Com isso o objetivo deste estudo é analisar o comportamento do processo de dispersão de diásporos na comunidade vegetal ao longo de uma cronossequência sucessional em áreas de Caatinga Hiperxerófila. A metodologia constituiu-se na divisão de três áreas de Caatinga selecionadas conforme seu estágio de sucessão, onde foi utilizado o método de parcelas, demarcando-se dois transectos de 30 m x 10 m, em cada condição; estes subdivididos em duas parcelas quadradas de 10 m², estando cada uma separada 10 m entre si. Avaliaram-se todos os indivíduos vegetais de fanerógamas, com hábito arbustivo-arbóreo, ≥ 30 cm de altura. Em seguida, realizou-se também a tipificação e classificação dos frutos e síndromes de dispersão. De acordo com os resultados obtidos, observou-se que a síndrome de dispersão por blastocoria destacou-se nos três estágios sucessionais com 46% no inicial, 40% no intermediário, seguido de anemocoria 27% no tardio. Verificou-se ainda uma redução no número de frutos secos à medida que a sucessão ecológica avançou, ocorrendo o inverso com os frutos carnosos. Desse modo observou-se que o processo de dispersão de propágulos em área de Caatinga Hiperxerófila varia de acordo com as alterações ambientais presentes em cada estágio sucessional analisado. Assim, no último estágio, a flora local utiliza-se de frutos carnosos como atrativos mais eficientes de dispersores; nos estágios iniciais da sucessão, houve predominância de estratégias de dispersão por vetores abióticos, como a anemocoria e blastocoria.

Palavras-chave: Blastocoria; sucessão ecológica; xerofilia.

Analysis of Diversity and Characterization of Diaspore Dispersal Syndromes in a Successional Gradient of Hyperxerophilic Caatinga

ABSTRACT – Seed dispersal refers to the removal or release of diaspores from the parent plant and allows fruits and/or seeds to escape being deposited in close proximity to the parent plant, where mortality rates are high. The objective of this study was to analyze the diversity and characterize the dispersal mechanisms of diaspores, along a successional chronosequence. The methodology consisted of dividing three Caatinga areas selected according to their succession stage, where the plot method was used, demarcating two transects of 30 m x 10 m, in each condition, these subdivided into two square plots of 10 m², each one 10 m apart. All individuals of phanerogamous plants, with shrub-arboreal habit, ≥ 30 cm in height, were evaluated. After, there was also the typification and classification of fruits and dispersion syndromes. According to the results obtained, it was observed that the syndrome of dispersion by blastochory stood out in the three successional stages with 46% in the initial, 40% in the intermediate, followed by anemochory 27% in the late. There was also a reduction in the number of dry fruits as the ecological succession progressed, with the opposite occurring with fleshy fruits. It was observed that the process of dispersion of propagules in an area of Hyperxerophytic Caatinga varies according to the environmental changes present in each successional stage analyzed. Thus, in the last stage, the local flora uses fleshy fruits as the most efficient attractant for dispersers, while in the early stages of succession, there was a predominance of dispersion strategies by abiotic vectors, such as anemochory and blastochory.

Keywords: Blastocoria; ecological succession; xerofilia.

Análisis de la Diversidad y Caracterización de los Síndromes de Dispersión de Diásporas en un Gradiente Sucesional de Caatinga Hiperxerófila

RESUMEN – La dispersión de semillas se refiere a la eliminación o liberación de diásporas de la planta madre y permite que las frutas y/o semillas escapen y se depositen muy cerca de la planta madre, donde las tasas de mortalidad son altas. Así, el objetivo de este estudio fue analizar la diversidad y caracterizar los mecanismos de dispersión de las diásporas, a lo largo de una cronosecuencia sucesiva. La metodología consistió en dividir tres áreas de Caatinga seleccionadas de acuerdo a su etapa de sucesión, donde se utilizó el método de parcelas, demarcando dos transectos de 30 m x 10 m, en cada condición, estos subdivididos en dos parcelas cuadradas de 10 m², separadas cada una por 10 m. . Se evaluaron todos los individuos vegetales de fanerógamas, con hábito arbustivo-arbóreo, ≥ 30 cm de altura. Luego, también estaba la tipificación y clasificación de frutos y síndromes de dispersión. De acuerdo a los resultados obtenidos se observó que el síndrome de dispersión por blastocoria se destacó en las tres etapas sucesionales con un 46% en la inicial, 40% en la intermedia, seguido de anemocoria 27% en la tardía. También hubo una reducción en el número de frutos secos a medida que avanzaba la sucesión ecológica, ocurriendo lo contrario con los frutos carnosos. Así, se observó que el proceso de dispersión de propágulos en un área de Caatinga Hiperxerofila varía según las alteraciones ambientales presentes en cada etapa sucesional analizada. Así, en la última etapa, la flora local utiliza frutos carnosos como el atrayente más eficiente para los dispersores, mientras que en las etapas iniciales de la sucesión predominaron las estrategias de dispersión por vectores abióticos, como la anemocoria y la blastocoria.

Palabras clave: Blastocoria; sucesión ecológica; xerofilia.

Introdução

O domínio morfoclimático da Caatinga, único com distribuição geográfica restrita ao território brasileiro, abrange parte dos estados do Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia e Minas Gerais e apresenta uma área aproximada de 800.000 km², correspondente a 11% do território nacional e 70% do território nordestino (Prado, 2003).

Nesse sentido, Giulietti (2003) dispõe que a Caatinga apresenta grande diversidade florística, com no mínimo 932 espécies, das quais 318 são endêmicas. No entanto, apesar dessa riqueza, a Caatinga tem sido bastante alterada pela ação antrópica em razão do uso inadequado do solo e de seus recursos naturais, bem como a superfície atingida por atividades agrícolas abrange 27,5% a 51,7% do bioma, de modo que as áreas não afetadas por essas perturbações formam “ilhas” de diversidade, cercadas por uma matriz de baixa complexidade (Castelletti et al., 2003).

Segundo Barbosa et al. (2002), os estudos das relações mutualísticas entre plantas e dispersor na Caatinga são de extraordinária importância, uma vez que esse domínio morfoclimático é de grande riqueza vegetacional e com um número abundante de espécies endêmicas.

Assim, alterações ambientais, como a fragmentação de habitat, comumente observadas nesses locais, podem levar à extinção global de espécies de plantas, tanto através do corte da vegetação, como pela remoção de seus agentes dispersores e/ou polinizadores (Machado e Lopes, 2004).

Destarte, a dispersão de sementes refere-se à retirada ou liberação dos diásporos da planta de origem. Esse processo é fundamental para o estabelecimento dos novos indivíduos de uma população, pois permite que frutos e/ou sementes escapem de serem depositados nas proximidades da planta de origem, onde as taxas de mortalidade são altas (Howe e Smallwood, 1982).

A dispersão de sementes tem por finalidade assegurar que o desenvolvimento de novas plantas não seja impedido pela competição com outros indivíduos por falta de espaço, de nutrientes, de luz, entre outros (Silva, 2010).

Nesse contexto, a sequência sucessional é entendida como uma forma de gradientes, em que as espécies são competitivamente substituídas. Dessa forma, Souza et al. (2015), apontam que 80% da vegetação da Caatinga foi inteiramente modificada, apresentando-se a maior parte das áreas em estágios iniciais ou intermediários de sucessão ecológica.

Não obstante, uma estratégia para a conservação de ambientes com certo grau de integridade e a recuperação daqueles modificados pelas perturbações antrópicas é elucidar as condições em que a dispersão de sementes ocorre (Jordano et al., 2006), uma vez que se constitui um processo-chave no ciclo de vida da maioria das plantas (Howe e Miriti, 2004).

Dessa forma, o objetivo do presente estudo foi analisar o comportamento do processo de dispersão de diásporos na comunidade vegetal ao longo de uma cronossequência sucessional em áreas de Caatinga Hiperxerófila.

Metodologia

Caracterização da área de estudo

Pernambuco está localizado no centro-leste da região Nordeste do Brasil e ocupa uma área de 98.148,323 km² (IBGE, 2010). Dentre os municípios que compõem o estado, encontra-se Serrita (07º56’00”S e 39º17’45”W), com uma extensão de 1.664 km², localizada na mesorregião do Sertão Central e microrregião de Salgueiro, a uma distância de 544 km da capital estadual Recife. O clima do município é tropical semiárido e sua temperatura média anual é de 25°C; a precipitação Pluviométrica varia de 450 a 600 mm por ano, sendo os meses mais chuvosos de dezembro a março. A vegetação do município é composta por Caatinga Hiperxerófila com plantas adaptadas a longos períodos de seca e um clima semiárido (IBGE, 2010).

Para este estudo, foi delimitada uma área amostral a oeste da cidade de Serrita, no sítio Urubu (7°50’32.3”S e 39°23’33.4”W), situado em zona rural, pertencente ao distrito de Ipueira, há 18 km da sede municipal, conforme a Figura 1. A região de trabalho caracteriza-se, principalmente, por fisionomia ecológica de Caatinga arbórea-arbustiva.

Coleta e análise de dados

O estudo foi realizado entre os meses de junho de 2015 a outubro de 2016, em uma cronossequência sucessional formada por três estágios (inicial, intermediário e tardio). As áreas de coleta foram escolhidas por possuírem as mesmas características ambientais, exceto o tempo de regeneração e a presença da ação antrópica. Além disso, as zonas de entorno de todas as condições analisadas possuíram a mesma característica fitofisionômica.

Nesse sentido, os pontos foram selecionados conforme seu estágio de sucessão, apresentando a seguinte ordem de regeneração:

• Estágio inicial “degradado”: áreas sujeitas à pressão antrópica, como extração de madeira para lenha, estacas, queimadas, pastoreio, entre outros.

• Estágio intermediário: área em processo de regeneração natural há cerca de cinco anos. Contudo, é importante frisar que, por não se tratar de uma área de proteção ambiental (APA), há possibilidade de interferência antrópica, mesmo que mínima, o que pode se considerar um fator de interferência.

• Estágio tardio “preservado”: encontra-se em bom estado de conservação, há mais de 80 anos, sem histórico recente de distúrbios naturais e antrópicos.

Para a coleta de dados, foi utilizado o método de parcelas, onde se demarcaram dois transectos de 30 m x 10 m em cada condição da cronossequência. Os transectos foram subdivididos em duas parcelas amostrais quadrangulares de 10 m x 10 m, totalizando 100 m², respeitando um intervalo de 10 m entre as parcelas (Figura 2). Na implantação dos transectos em campo, respeitou-se a mesma orientação geográfica (norte – sul) e a distância entre eles de, no mínimo, 100 m.

O levantamento florístico foi feito com a descrição dos nomes vernáculos das espécies, contagem dos indivíduos, observação em campo das síndromes de dispersão de diásporos e registros fotográficos. Durante a amostragem, foi adotado o mesmo critério de inclusão adotado por Oliveira Junior (2012) para estudos de sucessão ecológica em áreas de Caatinga Hiperxerófila, onde foram amostrados todos os indivíduos vegetais de fanerógamas, com hábito arbustivo-arbóreo, ≥ 30 cm (diâmetro à altura do solo), encontradas com o colo dentro das áreas delimitadas. Posteriormente as espécies foram identificadas pelo seu nome cientifico, família a qual pertencem e estágio de sucessão.

O sistema de classificação utilizado para identificação das espécies foi a APG III (2009), sendo adotados também como referências complementares dados do Centro Nordestino de Informações Sobre Plantas (CNIP) e literaturas pertinentes.

Para a tipificação dos frutos seguiu-se a classificação adaptada de Spjut (1994), com consultas a Gonçalves e Lorenzi (2007) e Souza e Lorenzi (2012): Drupa – frutos que apresentam uma única semente, muitas vezes transformada em caroço; Sâmara – apresenta uma ou mais expansões laterais em forma de asa; Cápsula – fruto originado a partir de um gineceu gamocarpelar, com dois a muitos carpelos; Núcula – fruto seco, não se abre espontaneamente ao amadurecer, geralmente unilocular e monospérmico; Baga – Fruto carnoso e com número variado de sementes; Legume – derivado de um ovário unicarpelar, mas se abre na maturidade por duas fendas; Cocárium – fruto seco monocárpico com abertura derivada de duas suturas longitudinais, sendo uma subclassificação dos frutos esquizocárpicos, visto que apresentam um pistilo composto separando-se em seu carpelo; Criptossâmara – caracteriza-se pela presença de um pericarpo com duas porções distintas: a externa que se separa em duas valvas distintas ou se rompe irregularmente, e a interna, membranácea ou coriácea, que encerra uma só semente. Também foram consideradas a consistência (seco ou carnoso) e a deiscência (deiscente ou indeiscente).

Nesse sentido, consideraram-se as seguintes síndromes, de acordo com a classificação de Van der Pijl (1982): Autocoria – dispersão realizada por si só, que se especifica em: balocoria (expulsão pela planta-mãe de cápsulas ou bagas secas) e blastocoria (onde acontece a liberação do diásporo por longos ramos ou estalões); Zoocoria – dispersão realizada por animais, que se subdividiu em: mamaliocoria (dispersão realizada por mamíferos) e ornitocoria (realizada por pássaros); e Anemocoria – dispersão realizada pelo vento.

Resultados e Discussões

Foram registradas, nas áreas em estudo, 35 espécies distribuídas em 12 famílias botânicas (Tabela 1), onde Fabaceae obteve maior riqueza de espécies, seguida de Anacardiaceae, sendo as únicas a apresentarem mais de um tipo de fruto: criptossâmara e legume, e drupa e sâmara, respectivamente. Fabaceae apresentou três tipos de síndromes de dispersão: blastocoria, balocoria e anemocoria (56%, 22% e 22%, respectivamente). As demais famílias que se destacaram em números de espécies foram Euphorbiaceae e Cactaceae, com apenas um tipo de fruto e, consequentemente, um tipo de dispersão.

A dominância da família Fabaceae nos levantamentos florísticos e ecológicos no Brasil é comum (Queiroz, 2002), visto que possui um grande número de táxons, até mesmo em diferentes tipologias de Caatinga. Assim, ressalta-se ainda que a presença de mais de uma síndrome nessa família é justificada pela variedade de formas e consistências dos frutos existentes (Noguchi et al., 2009).

Conforme obtido no estudo, o estágio inicial “degradado”, apresentou uma riqueza de 13 espécies com quatro tipos de síndromes de dispersão observadas: blastocoria, com 46% das espécies, seguida de ornitocoria, anemocoria e balocoria, não ocorrendo nenhuma espécie com síndrome por mamaliocoria (Figura 3).

Todas as seis espécies com dispersão por blastocoria apresentaram frutos secos deiscentes, a exemplo de C. phyllacanthus (faveleira) e J. mollissima (pinhão-roxo). As espécies dispersas por ornitocoria tiveram frutos carnosos, a exemplo de C. jamacaru (mandacaru) enquanto as espécies anemocóricas apresentaram frutos secos, como M. urundeuva (aroeira) e A. pyrifolium (pereiro). A única espécie dispersa por balocoria foi M. tenuiflora (jurema-preta), que apresentou também fruto seco.

Nesse sentido, conforme os resultados alcançados em primeiro momento, constata-se o destaque da dispersão por blastocoria, o tipo de disseminação realizado pela própria planta-mãe, corroborando com trabalhos que estudaram as síndromes de dispersão na Caatinga de Pernambuco, os quais também indicaram o predomínio de vetores abióticos, tais como o vento e a gravidade (Griz e Machado, 2001; Machado et al., 1997; Silva et al., 2013; Silva e Rodal, 2009).

O estágio intermediário apresentou uma riqueza de 15 espécies, onde foram observados cinco tipos de síndromes, sobressaindo-se a blastocoria com 40% das espécies, seguida por anemocoria, ornitocoria, mamaliocoria e balocoria (Figura 3). As seis espécies blastocóricas apresentaram frutos secos, como observado para P. pyramidalis (catingueira) e M. glaziovii (maniçoba), bem como os frutos das quatro espécies anemocóricas, exemplo: S. brasiliensis (baraúna). As três espécies dispersas por ornitocoria possuíam frutos carnosos, a exemplo de P. pachycladus (facheiro) e as espécies balocóricas e mamaliocóricas com apenas um exemplar de cada, apresentaram frutos secos e carnosos, respectivamente.

A predominância da blastocoria foi descrita por Silva et al. (2013) em seus estudos desenvolvidos em uma área de conservação na Caatinga no Monumento Natural Grota do Angico, em Sergipe, constatando essa síndrome de dispersão em 43,3% das espécies identificadas.

Griz e Machado (2001) também observaram que a anemocoria foi dominante nos estágios intermediário e tardio (preservado) em áreas de Caatinga. Esses estágios apresentam as árvores mais altas, cujos ramos acumulam maior energia potencial, permitindo a disseminação dos diásporos a maiores distancias da planta-mãe.

Além disso, é importante destacar a dependência de fatores abióticos, como o ar, por exemplo, para dispersão de sementes como aspecto comum em todos os estágios, principalmente pela anemocoria. Isso pode ser explicado por tratar-se de áreas de Caatinga hiperxerófitas, onde as chuvas são escassas, como é o caso do município de Serrita, o qual está inserido em uma região com baixo índice pluviométrico, em que a vegetação tende a adaptar-se e propagar-se por conta própria, corroborando com Silva e Rodal (2009).

O estágio tardio “preservado” obteve uma riqueza de 30 espécies e cinco tipos de síndromes de dispersão. A blastocoria e a anemocoria foram as mais frequentes, seguidas de ornitocoria, balocoria e mamaliocoria (Figura 3).

Os mesmos padrões anteriormente identificados para as estratégias de dispersão e a tipologia dos frutos no estágio intermediário da sucessão foram mantidos no estágio tardio, mesmo havendo alterações entre a composição florística identificada nos dois estágios.

Foi observado também que as espécies C. sonderianus (marmeleiro) e P. pyramidalis (catingueira), pertencentes às famílias Euphorbiaceae e Fabaceae, prevaleceram em todos os estágios sucessionais da cronossequência estudada, tendo a consistência do fruto seco deiscente e possuindo mecanismo de dispersão por blastocoria. Os resultados dos três estágios sucessionais também apontam para uma redução no número de frutos secos à medida que a sucessão ecológica avançava, ocorrendo o inverso com os frutos carnosos. A maior complexidade trófica e diversidade faunística presentes nos estágios mais avançados da sucessão permitem que haja um maior investimento em zoocoria como estratégia de dispersão. Assim, a flora utiliza-se de frutos carnosos como atrativo mais eficientes de dispersores em ecossistemas semiáridos, tendo como consequência sua maior ocorrência nesses estágios finais da sucessão.

Assim, ao relacionar a cronossequência sucessional às síndromes de dispersão, nota-se o predomínio da blastocoria nos três estágios, seguida de anemocoria e ornitocoria (Fig. 4). A balocoria se manteve acentuada nos dois primeiros estágios da sucessão, com aumento apenas no estágio tardio (preservado). A mamaliocoria apresentou um resultado bem semelhante, porém não ocorrendo no estágio inicial (degradado), não corroborando com os estudos de Griz e Machado (2001) sobre área de Caatinga em uma região semiárida do Nordeste brasileiro, onde foi analisado que a zoocoria representa o modo de dispersão mais observado, seguido de anemocoria, balística e barocoria.

Portanto, a dispersão de semente é importante para a forma de estabelecimento e interação das plantas no ambiente e consequentemente os organismos associados (Machado e Lopes, 2002). Desse modo, os padrões de síndromes de dispersão que foram descritas neste estudo mostram que a disseminação de propágulos depende também da complexidade e maturidade dos ecossistemas de Caatinga em que as espécies estão localizadas.

Conclusão

Diante dos dados apresentados, conclui-se que o processo de dispersão de propágulos em área de Caatinga Hiperxerófila varia de acordo com as alterações ambientais presentes em cada estágio sucessional analisado, dependendo da complexidade estrutural dos ecossistemas para sua efetividade. O fato evidencia-se a partir das observações de padrões estratégicos distintos para dispersão ao longo do gradiente sucessional analisado e o aumento da frequência de emprego de frutos carnosos na dispersão zoocórica nos estágios sucessionais mais avançados. Neste último caso, a flora local utiliza-se de frutos carnosos como atrativo mais eficientes de dispersores. Em compensação, nos estágios iniciais da sucessão, houve predominância de estratégias de dispersão por vetores abióticos, como a anemocoria e blastocoria, as quais se utilizam de agentes de dispersão não dependentes da estrutura e complexidade da comunidade biológica local, como o vento e a gravidade, respectivamente.

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Figura 1 – Mapa de Localização geográfica do município de Serrita, evidenciando a área de estudo (sítio Urubu).

Fonte: Modificado de Lavôr; Lavor; Santos (2021) e Google maps (2023).

Figura 2 – Desenho amostral utilizado na implantação dos transectos em campo.

Fonte: Braga (2023).

Tabela 1 – Características dos frutos e Síndromes de Dispersão ocorrentes ao longo da cronossequência sucessional. CO = Consistência (S = Seco, C = Carnoso), DE = Deiscência (I = indeiscente, D = Deiscente), TF = Tipo de fruto (Dru = Drupa, Sâm = Sâmara, Cáp = Cápsula Núc = Núcula, Bag = Baga, Leg = Legume, Coc = Cocárium, Crip = Criptossâmara), SD = Síndrome de Dispersão (Ane = Anemocoria, Mam = Mamaliocoria, Or = Ornitocoria, Bla = Blastocoria, Bal = Balocoria), Ini. = Inicial, Int. = Intermediário, Tar. = Tardio.

Família/Espécie

CO

DE

TF

SD

Estágio

Ini.

Int.

Tar.

Anacardiaceae

Myracrodruon urundeuva Allemao

S

I

Dru

Ane

X

X

X

Schinopsis brasiliensis Engl.

S

I

Sâm

Ane

-

X

X

Spondias tuberosa Arruda

C

I

Dru

Mam

-

-

X

Apocynaceae

Aspidosperma pyrifolium Mart.

S

D

Cáp

Ane

X

X

X

Boraginaceae

Varronia leucocephala (Moric.) J.S.Mill

S

D

Núc

Orn

-

X

X

Bignoniaceae

Tabebuia spongiosa Rizzini

S

D

Cáp

Ane

-

-

X

Burseraceae

Commiphora leptophloeos (Mart.) J. B. Gillett

C

D

Dru

Mam

-

-

X

Cactaceae

Arrojadoa rhodantha Britton & Rose

C

I

Bag

Orn

-

-

X

Cereus jamacaru DC.

C

I

Bag

Orn

X

X

X

Pilosocereus pachycladus F.Ritter

C

I

Bag

Orn

X

X

X

Pilosocereus gounellei (F. A. C. Weber) Byles & G. D. Rowley

C

I

Bag

Orn

X

X

-

Tacinga inamoena (K.Schum.) N. P. Taylor & Stuppy

C

I

Bag

Orn

X

X

-

Tacinga palmadora (Britton & Rose) N. P. Taylor

C

I

Bag

Orn

-

-

X

Capparaceae

Cynophalla flexuosa (L.) J.Presl

C

D

Leg

Orn

-

-

X

Colicodendron yco (Mart.) Mart.

C

D

Leg

Orn

-

-

X

Combretacea

Thiloa glaucocarpa (Mart.) Eichler

C

D

Sâm

Ane

-

X

X

Euphorbiaceae

Cnidoscolus phyllacanthus (M. Arg.) Pax et K. Hoffm.

S

D

Coc

Bla

X

X

-

Cnidoscolus pubescens Pohl.

S

D

Coc

Bla

X

-

X

Euphorbiaceae

Cnidoscolus urens (L.) Arthur

S

D

Coc

Bla

X

-

X

Croton heliotropiifolius Kunth.

S

D

Coc

Bla

-

-

X

Croton sonderianus Mull. Arg.

S

D

Coc

Bla

X

X

X

Jatropha mutabilis (Pohl) Baill.

S

D

Coc

Bla

-

X

X

Jatropha mollissima (Pohl) Baill.

S

D

Coc

Bla

X

X

-

Manihot glaziovii Mull. Arg.

S

D

Coc

Bla

-

X

X

Fabaceae

Amburana cearensis (Allemao) A.C.Sm.

S

D

Crip

Ane

-

-

X

Anadenanthera colubrina (Vell.) Brenan

S

D

Leg

Ane

-

-

X

Caesalpinia microphylla Mart. ex G. Don

S

D

Leg

Bla

-

-

X

Libidibia ferrea (Mart. ex Tul.) L. P. Queiroz

S

D

Leg

Bal

-

-

X

Mimosa tenuiflora (Willd.) Poir.

S

D

Leg

Bal

X

X

-

Mimosa sp.

S

D

Leg

Bal

-

-

X

Piptadenia moniliformis Benth.

S

D

Leg

Bal

-

-

X

Piptadenia stipulacea (Benth.) Ducke

S

D

Leg

Bal

-

-

X

Poincianella pyramidalis (Tul.) L. P. Queiroz

S

D

Leg

Bla

X

X

X

Malvaceae

Pseudobombax marginatum (St. Hill) Rob.

S

D

Cáp

Ane

-

-

X

Rhamnaceae

Ziziphus joazeiro Mart.

C

I

Dru

Mam

-

X

X

Fonte: Lavor, 2023.

Figura 3 – Frequência observada das síndromes de dispersão ao longo da cronossequência sucessional de Caatinga Hiperxerófita no Sertão Central Pernambucano.

Fonte: Lavor, 2023.

Figura 4 – Comportamento dos diferentes tipos de síndromes de dispersão ao longo da cronossequência sucessional de Caatinga Hiperxerófita no Sertão Central Pernambucano.

Fonte: Lavor, 2023.

Biodiversidade Brasileira – BioBrasil.

Fluxo Contínuo

n.3, 2023

http://www.icmbio.gov.br/revistaeletronica/index.php/BioBR

Biodiversidade Brasileira é uma publicação eletrônica científica do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) que tem como objetivo fomentar a discussão e a disseminação de experiências em conservação e manejo, com foco em unidades de conservação e espécies ameaçadas.

ISSN: 2236-2886