Análise da suscetibilidade de espécies da ictiofauna da região hidrográfica do rio Paraguai aos incêndios de 2020
Sheila Rancura1*
https://orcid.org/0009-0007-2936-3306
* Contato principal
Cindy Emanuelly Brito2
https://orcid.org/0009-0009-7571-1804
Davidson Gomes Nogueira3
https://orcid.org/0000-0002-9180-4500
Carla Natacha Marcolino Polaz1
https://orcid.org/0000-0002-3890-3008
Izabel Correa Boock de Garcia1
https://orcid.org/0000-0002-2252-3799
1 Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade/ICMBio, Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da Biodiversidade Aquática Continental/CEPTA, Pirassununga/SP, Brasil. <sheila.rancura@icmbio.gov.br, carla.polaz@icmbio.gov.br, izabel.garcia@icmbio.gov.br>.
2 Universidade do Estado de Mato Grosso/UNEMAT, Cáceres/MT, Brasil. <emanuellycindy@outlook.com>.
3 Universidade Federal de Mato Grosso do Sul/UFMS, Instituto de Biociências/INBIO, Campo Grande/MS, Brasil. <davidson.spike@gmail.com>.
RESUMO – A região hidrográfica do rio Paraguai abriga a maior superfície continental inundável do planeta, o Pantanal brasileiro. Seus pulsos de inundação influenciam os ciclos da biodiversidade regional, tendo elevada importância para a manutenção da abundância de peixes. Contudo, mudanças climáticas associadas a alterações antrópicas modificam sua dinâmica, aumentando a possibilidade de eventos extremos como os incêndios do ano de 2020. Neste contexto, buscou-se avaliar espécies da ictiofauna da macrorregião hidrográfica do rio Paraguai suscetíveis aos impactos dos incêndios de 2020, por meio do levantamento de áreas queimadas, da identificação das espécies mais sensíveis aos impactos do fogo e da percepção dos pescadores sobre os impactos dos incêndios. Dentre as espécies avaliadas neste estudo foram identificadas como mais suscetíveis aos impactos dos incêndios Neofundulus paraguayensis (Eigenmann & Kennedy, 1903), Hyphessobrycon rutiliflavidus Carvalho, Langeani, Miyazawa & Troy, 2008, Pseudoplatystoma corruscans (Spix & Agassiz, 1829), Piaractus mesopotamicus (Holmberg, 1887) e Zungaro jahu (Ihering, 1898). As regiões de pesca utilizadas pelas colônias de Barão de Melgaço, Miranda e Rondonópolis foram as mais atingidas pelo fogo, tanto na análise das áreas queimadas quanto na percepção dos pescadores. A percepção dos pescadores aparenta ser um bom indicador dos efeitos dos grandes incêndios sobre a disponibilidade dos recursos pesqueiros. Assim, o monitoramento participativo da pesca pode fornecer dados sobre a situação das populações de peixes ao longo do tempo, contribuindo para a compreensão das mudanças provocadas por eventos extremos sobre a dinâmica ecológica da região.
Palavras-chave: Peixes; incêndios; pesca; planície de inundação.
Analysis of the susceptibility of fish species in the hydrographic region of the Paraguay river to the 2020 fires
ABSTRACT – The hydrographic region of the Paraguay River encompasses the largest flooded continental surface on the planet, the Brazilian Pantanal. Its flood pulses influence the cycles of regional biodiversity, playing a crucial role in maintaining fish abundance. However, climate change associated with anthropogenic alterations is impacting the ecosystem dynamics, increasing the likelihood of extreme events such as the fires in the year 2020. In this context, we sought to evaluate fish species in the hydrographic region of the Paraguay River susceptible to the impacts of the 2020 fires, through the survey of burned areas, identification of species most sensitive to fire impacts, and perception of fishermen about fire impacts. Among the species assessed in this study, the ones identified as having higher susceptibility to fire were Neofundulus paraguayensis (Eigenmann & Kennedy, 1903), Hyphessobrycon rutiliflavidus Carvalho, Langeani, Miyazawa & Troy, 2008, Pseudoplatystoma corruscans (Spix & Agassiz, 1829), Piaractus mesopotamicus (Holmberg, 1887), and Zungaro jahu (Ihering, 1898). The fishing regions used by the colonies of Barão de Melgaço, Miranda, and Rondonópolis were the most affected by fire, both in the analysis of burned areas and fishermen’s perception. Fishermen’s perception appears to be a good indicator of the effects of large fires on fishery resource availability. Thus, participatory fishing monitoring can provide data on the status of fish populations over time, contributing to understanding changes caused by extreme events on the ecological dynamics of the region.
Keywords: Fish; fires; fishing; floodplain.
Análisis de la susceptibilidad de especies de la ictiofauna de la región hidrográfica del río Paraguay a los incendios de 2020
RESUMEN – La región hidrográfica del río Paraguay alberga la mayor superficie continental inundable del planeta, el Pantanal brasileño. Sus pulsos de inundación influyen en los ciclos de biodiversidad regional, siendo de gran importancia para mantener la abundancia de peces. Sin embargo, los cambios climáticos asociados con alteraciones antropogénicas modifican su dinámica, aumentando la posibilidad de eventos extremos como los incendios del año 2020. En este contexto, se buscó evaluar las especies de la ictiofauna de la región hidrográfica del río Paraguay susceptibles a los impactos de los incendios de 2020, mediante el levantamiento de áreas quemadas, la identificación de las especies más sensibles a los impactos del fuego y la percepción de los pescadores sobre los impactos de los incendios. Entre las especies evaluadas en este estudio se identificaron como más susceptibles a los impactos de los incendios a Neofundulus paraguayensis (Eigenmann & Kennedy, 1903), Hyphessobrycon rutiliflavidus Carvalho, Langeani, Miyazawa & Troy, 2008, Pseudoplatystoma corruscans (Spix & Agassiz, 1829), Piaractus mesopotamicus (Holmberg, 1887) y Zungaro jahu (Ihering, 1898). Las regiones de pesca utilizadas por las colonias de Barão de Melgaço, Miranda y Rondonópolis fueron las más afectadas por el fuego, tanto en el análisis de las áreas quemadas como en la percepción de los pescadores. La percepción de los pescadores parece ser un buen indicador de los efectos de los grandes incendios sobre la disponibilidad de los recursos pesqueros. Así, el monitoreo participativo de la pesca puede proporcionar datos sobre la situación de las poblaciones de peces a lo largo del tiempo, contribuyendo a la comprensión de los cambios provocados por eventos extremos sobre la dinámica ecológica de la región.
Palabras clave: Peces; incendios; pesca; planicie de inundación.
Recebido em 28/02/2024 – Aceito em 22/08/2024
Como citar:
Rancura S, Brito CE, Nogueira DG, Polaz CNM, Garcia Garcia ICB. Análise da suscetibilidade de espécies da ictiofauna da região hidrográfica do rio Paraguai aos incêndios de 2020. Biodivers. Bras. [Internet]. 2024; 14(4): 89-105. doi: 10.37002/biodiversidadebrasileira.v14i4.2552
Introdução
A região hidrográfica do rio Paraguai abriga a maior superfície continental inundável do planeta, o Pantanal brasileiro. As planícies inundáveis são conhecidas por conter uma grande variedade de espécies [1][2]. Essas regiões são de grande importância para a pesca, pois oferecem uma abundância de alimentos e abrigo aos peixes [3][4], o que resulta em um alto potencial de produção pesqueira. O Pantanal é considerado o maior sistema alagável de água doce contínuo do mundo, ocupando uma área com cerca de 179.300 km², abrangendo parte dos estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, no Brasil, e áreas no Paraguai e na Bolívia [5][6][7]. A planície pantaneira possui uma relação de interdependência com a região de planalto, responsável por grande parte da produção hídrica que mantém o pulso de inundação do Pantanal [8]. Fatores como precipitação, ciclos climáticos e alterações no uso e ocupação do solo afetam a intensidade e duração das inundações, que, por sua vez, influenciam os ciclos da biodiversidade regional, assim como das pessoas que dela dependem [9].
Diferenças no regime hidrológico e variações do relevo criam um mosaico de ambientes sujeitos a inundações periódicas, propiciando a manutenção de uma comunidade aquática abundante e diversificada [10]. Assim, na medida em que essas áreas fornecem sítios reprodutivos, alimento e abrigo contra predadores, contribuem para uma elevada produção pesqueira [11]. Tal produção sustenta uma atividade econômica regionalmente significativa [12], refletindo na grande importância dos peixes para a população pantaneira [10][11][12][13]. A pesca de subsistência é a principal fonte de alimentação das populações ribeirinhas; além desse tipo de pesca, ainda ocorrem a pesca comercial (ou profissional) artesanal e esportiva, que movimentam a economia da região. A pesca profissional artesanal é exercida por pescadores que realizam a pesca de forma autônoma e têm nessa atividade seu principal meio de vida, utilizando recursos de produção próprios, seja individualmente ou com o auxílio de outros parceiros e sem vínculo empregatício [14]. A principal forma de organização social desse tipo de pesca é por meio das Colônias de Pescadores. A pesca também se constitui num dos principais atrativos turísticos do Pantanal, gerando emprego e renda na indústria hoteleira e na comercialização de insumos para a pesca, como a compra e venda de iscas [15]. A pesca comercial tem como foco principal espécies migradoras de longa distância, por serem de médio e grande porte. Estudos de diagnóstico pesqueiro na região hidrográfica do Paraguai realizados pela Agência Nacional de Águas (ANA) [14] apontaram que as espécies mais capturadas pela pesca profissional artesanal em 2018 foram Pseudoplatystoma corruscans (Spix & Agassiz, 1829), Piaractus mesopotamicus (Holmberg, 1887), Megaleporinus macrocephalus (Garavello & Britski, 1988), Pseudoplatystoma reticulatum Eigenmann & Eigenmann ,1889, Brycon hilarii (Valenciennes, 1850) e Zungaro jahu (Ihering, 1898).
O Pantanal brasileiro teve grande parte de sua área afetada pelo fogo no ano de 2020 [16]. Dentre as consequências dos incêndios é possível citar a perda da vegetação, a modificação generalizada do solo, a facilitação de processos erosivos e a mortalidade direta e indireta da fauna silvestre [17][18]. As alterações ao nível da vegetação e solo interferem no ambiente aquático [17] mas pouco se sabe como os incêndios afetaram a ictiofauna da região. A compreensão do impacto dos grandes incêndios sobre a biodiversidade é importante para o planejamento de ações de manejo, inclusive aquelas voltadas à conservação das espécies ameaçadas de extinção [16].
Nesse contexto, o objetivo geral deste trabalho foi avaliar a suscetibilidade de espécies da ictiofauna aos impactos dos incêndios de 2020 na região hidrográfica do rio Paraguai, por meio do mapeamento das áreas queimadas, da identificação das espécies mais sensíveis aos impactos do fogo e da percepção dos pescadores sobre as consequências dos incêndios na atividade pesqueira.
Material e Métodos
Foi definida como área de estudo a Macrorregião Hidrográfica do Paraguai, que corresponde à bacia hidrográfica do rio Paraguai situada no território nacional, compreendendo trechos do alto e médio rio Paraguai [19][20]. Destaca-se que o termo “Região Hidrográfica do Paraguai” (RHI Paraguai) foi usado como sinônimo de “Macrorregião Hidrográfica do Paraguai” estabelecida na Divisão Hidrográfica Nacional atualizada em 2021 [20]. O recorte da RHI Paraguai foi utilizado por contemplar aspectos físicos e bióticos intimamente relacionados à distribuição da ictiofauna e à dinâmica do bioma Pantanal [8][14]. A RHI Paraguai é composta por duas grandes unidades de relevo: o planalto e a planície pantaneira. A planície corresponde ao bioma Pantanal [6] e o planalto corresponde ao grande produtor de água e sedimentos que são transportados em direção à planície. Assim, as chuvas que ocorrem nas cabeceiras dos rios na região do planalto, associadas as peculiaridades de relevo e geologia da planície são as principais responsáveis pelos pulsos de inundação que caracterizam o bioma Pantanal, viabilizando sua diversidade de ambientes aquáticos que influenciam na composição e abundância da ictiofauna [10].
Foram consideradas espécies de interesse os peixes com ocorrência registrada [21] na RHI Paraguai e classificados como ameaçados (categorias CR, EN ou VU) ou quase ameaçados (categoria NT) até junho de 2022 no Sistema de Avaliação do Risco de Extinção da Biodiversidade (SALVE/ICMBio) [21] e/ou na Portaria MMA n. 148/2022 [22], além daqueles identificados como importantes para a pesca regional em estudo realizado pela ANA e parceiros sobre a ictiofauna e pesca na RHI Paraguai [14]. Dessa forma, foram selecionadas 21 espécies-alvo para o presente estudo (Quadro 1).
A sensibilidade ao fogo das diferentes espécies-alvo do estudo foi avaliada a partir de pontuações atribuídas às seguintes características: endemismo; hábitos alimentares; época de desova; época do período reprodutivo; densidade e grau de ameaça. O valor zero foi atribuído às qualidades que não tendem a tornar a espécie mais vulnerável aos efeitos das queimadas. Valores maiores foram atribuídos às características com maior potencial para influenciar negativamente na sobrevivência dos peixes durante e após a passagem do fogo [23]. As informações sobre as espécies foram levantadas a partir de dados disponíveis nas fichas específicas do sistema SALVE/ICMBio e na literatura científica [14][24][25][26]. A análise dessas características foi associada ao tamanho da área de distribuição e ao mapeamento das áreas queimadas para identificar as espécies provavelmente mais suscetíveis aos impactos do fogo.
A percepção dos pescadores sobre os efeitos do fogo na atividade pesqueira foi obtida por meio da realização de questionário estruturado. O questionário continha perguntas sobre a localização dos rios utilizados, as principais espécies pescadas e se os pescadores perceberam alguma influência das queimadas em suas áreas de pesca ou sobre os peixes. Inicialmente, as 18 colônias de pescadores existentes na RHI Paraguai foram divididas em duas categorias: mais e menos afetadas pelo fogo, conforme indicação das equipes da Embrapa Pantanal, da Secretaria de Estado de Meio Ambiente de Mato Grosso (SEMA/MT) e do Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (IMASUL/MS). Em seguida, foi realizado um sorteio para a seleção de três colônias em cada categoria. Foram sorteadas as colônias de Cáceres/MT, Barão de Melgaço/MT e Miranda/MS na categoria de colônias indicadas como mais afetadas pelo fogo e Rondonópolis/MT, Nobres/MT e Coxim/MS na categoria de colônias indicadas como as menos afetadas. Em cada colônia, foram realizadas dez entrevistas, totalizando 60 pescadores/as entrevistados/as. Destaca-se que as indicações das colônias mais ou menos afetadas pelo fogo usadas como critério para a seleção dos locais a serem amostrados foram baseadas numa percepção preliminar das equipes da Embrapa Pantanal e das Secretarias de Meio Ambiente Estaduais a respeito dos impactos do fogo, dado que tais equipes possuem especialistas em recursos pesqueiros da RHI Paraguai e grande conhecimento da realidade local.
Para o mapeamento das áreas queimadas, foram considerados diferentes recortes geoespaciais. Para as seis espécies de distribuição restrita, foram utilizadas suas áreas de ocorrência, elaboradas a partir da descrição constante da ficha da espécie no sistema SALVE [21]. Para as espécies de distribuição ampla, foram utilizadas duas unidades de análise: a RHI Paraguai e o bioma Pantanal [6][20]. As regiões de pesca utilizadas por cada colônia de pescadores foram mapeadas a partir das Microrregiões Hidrográficas [20] vinculadas aos rios utilizados para pesca e citados pelos pescadores nas entrevistas. Foi considerada uma região de pesca por colônia, totalizando seis regiões de pesca, as quais, para algumas regiões, apresentaram sobreposições. No total, foram mapeados 14 territórios, sendo seis áreas ocupadas por espécies de distribuição restrita, duas áreas ocupadas por espécies de distribuição ampla e seis áreas correspondentes a cada região de pesca das diferentes colônias de pescadores avaliadas neste estudo.
As unidades geoespaciais selecionadas para o estudo foram sobrepostas à base de dados de uso e cobertura da terra (Coleção 7) e cicatrizes de fogo (Coleção 1) disponibilizadas pelo Projeto MapBiomas [27][28]. As classes de uso e cobertura da terra do MapBiomas presentes na RHI Paraguai foram reagrupadas em três classes: Área antrópica (1), Área natural terrestre (2) e Campo alagado, área pantanosa e corpos hídricos (3), esta última representando o habitat da ictiofauna. Para cada território avaliado, foi calculado o percentual de área total queimada e o percentual de habitat da ictiofauna atingido pelo fogo em 2020. As análises foram executadas em ambiente SIG por meio do software livre QGIS 3.28 e na plataforma Google Earth Engine. Foi utilizado o software Excel para a realização dos cálculos e sistematização dos dados.
Resultados e Discussão
De acordo com as características avaliadas, as espécies que provavelmente apresentam maior sensibilidade aos impactos do fogo são: Austrolebias ephemerus, Pseudoplatystoma corruscans, Neofundulus paraguayensis, Melanorivulus dapazi, Ancistrus formoso, Trichomycterus dali, Hyphessobrycon rutiliflavidus, Piaractus mesopotamicus e Zungaro jahu (Quadro 2).
Dentre as espécies citadas, A. ephemerus, A. formoso, T. dali, M. dapazi, N. paraguayensis e H. rutiliflavidus possuem distribuição restrita e características como endemismo e baixa densidade, além de suas categorias de ameaça contribuírem para aumentar a sensibilidade ao fogo. As espécies de distribuição ampla consideradas mais sensíveis foram: P. corruscans (pintado), Z. jahu (jaú) e P. mesopotamicus (pacu), migradoras de longa distância e com hábito alimentar baseado na predação de peixes menores (pintado e jaú) ou com tendência à frugivoria (pacu). Para as espécies de ampla distribuição, características reprodutivas e hábitos alimentares tiveram maior influência na definição da sensibilidade ao fogo.
A avaliação da susceptibilidade ao fogo foi resultado da associação entre os dados de sensibilidade ao fogo, distribuição das espécies e do mapeamento das áreas queimadas (Figura 1).
O mapeamento das áreas queimadas indicou que os territórios de duas espécies com distribuição restrita além do bioma Pantanal (representando um dos territórios utilizados pelas espécies de distribuição ampla e de interesse para a pesca) apresentaram as maiores proporções de área queimada e habitat da ictiofauna atingidos pelo fogo (Figura 2).
Os resultados mostram que o habitat de N. paraguayensis, um rivulídeo com ocorrência restrita ao Pantanal do Nabileque, uma planície de inundação na porção sul do Pantanal [29], foi o mais atingido por queimadas. O território e o habitat ocupado por H. rutiliflavidus também está entre os mais atingidos pelo fogo, uma condição preocupante, dado que H. rutiliflavidus possui ocorrência registrada apenas nas cabeceiras dos riachos que drenam para afluentes do rio Cuiabá [30].
Dentre as demais espécies com distribuição restrita, os peixes troglóbios A. formoso e T. dali apresentaram habitat pouco atingido por queimadas, devido às características intrínsecas aos seus locais de ocorrência (cavernas inundadas). Os rivulídeos M. dapazi, com distribuição limitada à parte média-alta da drenagem do rio Correntes, e A. ephemerus, restrito a lagoas temporárias da região do rio Paraguai em Porto Murtinho, também não apresentaram altas proporções de habitat atingido pelo fogo. Cabe destacar que as áreas de ocorrência de A. formoso e T. dali não abrangem porções do bioma Pantanal e M. dapazi possui apenas 9% de seu território sobreposto a este bioma.
Com relação aos incêndios que afetaram os territórios ocupados por espécies de distribuição ampla, observa-se que no ano de 2020 cerca de 11% da área de alagados e corpos hídricos do bioma Pantanal foram atingidos pelo fogo, afetando negativamente ambientes importantes para as espécies migradoras de longas distâncias. A entrada de resíduos de queimadas nos corpos hídricos prejudica a qualidade da água. Facilitada por características inerentes à organização espacial da rede fluvial, as alterações ocasionadas pelos incêndios promovem mudanças no PH, oxigênio dissolvido e outros parâmetros físico-químicos dos corpos hídricos [31]. Além disso, a perda de vegetação e alterações no solo contribuem para processos erosivos e maior entrada de sedimentos nos canais, com efeito cumulativo ao longo das drenagens, resultando em alterações na morfologia do canal, na qualidade da água e na perda da conectividade fluvial [33]. Neste sentido, os resultados apontaram que as espécies de interesse para pesca mais provavelmente afetadas são P. corruscans (ameaçado de extinção), P. mesopotamicus e Z. jahu.
Por se tratar de espécie frugívora, P. mesopotamicus (pacu) é bastante afetado pela perda de mata ciliar [34]. Para outras espécies com hábito alimentar predominantemente herbívoro e frugívoro a perda de vegetação provocada por queimadas implica na diminuição da disponibilidade de recursos alimentares e na qualidade da dieta. Estudos indicaram que espécies de peixes sensíveis às mudanças da vegetação nativa apresentam declínio populacional em limiares menores do que aqueles detectados para vertebrados terrestres, respondendo negativamente a valores inferiores a 10% de perda da vegetação nativa [33].
Apesar dos ciclos entre períodos secos e chuvosos serem característicos da região, nos anos de 2019 e 2020 o Pantanal atravessou uma seca prolongada, marcada por um início tardio do período chuvoso [35]. Essa condição influenciou o nível dos rios, sendo que em outubro de 2020 o Serviço Geológico do Brasil/Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM) informou que em todas as estações fluviométricas de monitoramento da Bacia do rio Paraguai os níveis encontravam-se abaixo do normal para o período [36]. Em 2020, o rio Paraguai apresentou o nível mais baixo dos últimos 17 anos durante o período de inundação [16]. Questões climáticas como o aumento de períodos secos e a diminuição da precipitação são documentadas em diversos estudos na região [36][37][38], aumentando a possibilidade de incêndios e alterando a dinâmica de inundações, com consequências indesejadas para a biodiversidade regional.
A Figura 3 representa a variação da superfície hídrica da RHI Paraguai entre os anos de 1985 e 2021. Para além da dinâmica temporal de cheias e secas da região, nota-se uma tendência de diminuição da superfície hídrica ao longo dos anos. De fato, o mapeamento da dinâmica da superfície de água no Brasil realizado pelo Projeto MapBiomas indicou que a RHI Paraguai e o bioma Pantanal possuem as maiores tendências de redução da superfície de água. De acordo com os dados disponíveis na plataforma Mapbiomas Água [39], entre 1985 e 2002 a superfície de água na RHI Paraguai se mantinha acima de 1.000.000 ha, com um decréscimo contínuo acentuando-se em meados dos anos 2000 e chegando à menor extensão em 2021, com cerca de 378.029 ha (Figura 3).
A alteração no nível de água afeta a cobertura do solo, que varia de campos alagados a formações campestres nos períodos mais secos. Na cheia, parte da vegetação alagada se decompõe, servindo de substrato para o desenvolvimento da vegetação aquática e como fonte de alimento aos peixes detritívoros, herbívoros, insetívoros e onívoros, que são a base da cadeia alimentar dos peixes carnívoros e de outras espécies animais [11]. Na fase seca, o canal do rio serve como rota de migração, dispersão e refúgio para organismos aquáticos e o crescimento da vegetação terrestre nas áreas anteriormente alagadas é favorecido pela fertilização decorrente da decomposição da vegetação submersa na fase anterior [11]. Em anos mais secos, o nível da água é insuficiente para inundar os campos ao longo dos rios, criando condições mais favoráveis para os incêndios, comumente originados por atividades antrópicas [16]. Logo, os pulsos de inundação influenciam a proporção de habitat disponível para a ictiofauna, assim como as áreas que ficam suscetíveis ao fogo. O fogo consome a matéria orgânica que seria acumulada na planície de inundação e utilizada como substrato e fonte de alimento para organismos aquáticos. Potencializada pelo início do período úmido, a entrada de resíduos de queimadas nos corpos hídricos prejudica a qualidade da água, causando estresse oxidativo e diminuição da capacidade de nado em peixes [31]. A presença das cinzas dos incêndios na água modifica parâmetros físico-químicos e diminui a quantidade de oxigênio dissolvido, comprometendo a sobrevivência de organismos aquáticos [32]. Nesse sentido, a diminuição da superfície hídrica regional associados a eventos climáticos extremos como os grandes incêndios comprometem não apenas a biota aquática, mas também animais que têm nos peixes um importante recurso alimentar.
As alterações decorrentes dos incêndios têm reflexos sobre a dinâmica reprodutiva das espécies migradoras, que se caracteriza pela movimentação dos peixes em direção às cabeceiras dos rios que compõem o Pantanal, no final da estação seca. Ali ocorrem as desovas e, posteriormente, a deriva de ovos e larvas rio abaixo para a planície de inundação pantaneira, ambiente fundamental para a alimentação e desenvolvimento de juvenis de grande parte das espécies [14][40]. As áreas alagáveis da planície são de fundamental importância para alimentação e acúmulo de reservas que viabilizam o desenvolvimento das gônadas e o processo de migração até os locais de desova [14]. Quando peixes migradores não conseguem acumular reservas suficientes, deixam de realizar a migração ou não conseguem completá-la, seus ovários entram em regressão e os ovócitos são reabsorvidos [40], resultando em impactos no recrutamento e na reprodução da ictiofauna regional [14][40].
Dessa forma, para o pintado, o jaú, o pacu e outras espécies migradoras de grande porte, os principais impactos do fogo estão relacionados à perda e à degradação dos ambientes necessários à alimentação, reprodução e sobrevivência das larvas, assim como a diminuição da conectividade hidrológica, que prejudica o processo migratório. É importante considerar a atuação sinérgica de fatores como as queimadas, a diminuição da superfície hídrica, alterações no uso e ocupação do solo e o aumento de barramentos na região hidrográfica do Paraguai que potencializam a fragmentação do habitat e prejudicam a conectividade hidrológica entre planície e planalto, comprometendo a ictiofauna regional [14].
De forma complementar aos dados obtidos sobre a suscetibilidade da ictiofauna aos incêndios, foi verificado como o fogo afetou as áreas de pesca utilizadas pelos pescadores vinculados às colônias amostradas no estudo (Figura 4). Destaca-se que as regiões de pesca foram mapeadas a partir das microrregiões hidrográficas [20] vinculadas aos rios citados pelos pescadores entrevistados. Embora tais regiões representem territórios possivelmente mais abrangentes que os diretamente utilizados pelos pescadores, os impactos em cada bacia influenciam tanto a qualidade dos rios quanto a atividade pesqueira.
A Figura 5 indica o percentual da área queimada em cada região de pesca e a proporção de habitat da ictiofauna atingido por queimadas nas áreas utilizadas por cada colônia.
A região de pesca utilizada pelos pescadores vinculados à colônia de Miranda/MS teve as maiores proporções de área e habitat atingidos por incêndios. As regiões utilizadas pelos pescadores das colônias de Rondonópolis/MT e Barão de Melgaço/MT também estão entre as mais atingidas pelas queimadas.
Nas colônias de Barão de Melgaço/MT, Miranda/MS e Rondonópolis/MT, 100% dos pescadores indicaram que suas áreas de pesca foram afetadas pelo fogo (Figura 6), corroborando os resultados apresentados na Figura 5, na qual essas três colônias apresentaram as maiores proporções de áreas atingidas por incêndios. Apesar de Coxim/MS também apresentar um alto percentual de pescadores que observaram os efeitos das queimadas em suas regiões de pesca os resultados obtidos a partir do mapeamento das áreas queimadas não corroboraram esta percepção. Nas demais colônias os resultados indicam que os impactos do fogo podem ter sido menos intensos e não foram percebidos de forma tão acentuada pelos pescadores.
Os peixes citados como mais afetados pelas queimadas na percepção dos pescadores foram o pacu, o piavuçu e o pintado (Figura 7). Peixes de pequeno porte utilizadas como iscas também foram citados como afetados pelas queimadas, uma vez que fatores relacionados aos incêndios, como acúmulo de cinzas e materiais particulados alteram a qualidade da água, interferindo na comunidade aquática [17][32].
Pouco mais de um terço dos pescadores (36%) não indicou espécies afetadas nominalmente. Deve-se destacar que os impactos do fogo sobre o ambiente aquático podem ser menos perceptíveis, porém tendem a se acumular com o passar dos anos. As alterações no ambiente terrestre favorecem processos erosivos e interferem na morfologia e conectividade dos canais, modificando o fluxo de indivíduos e a estrutura e composição das comunidades de peixes ao longo do tempo [33].
Ao correlacionar as análises para a susceptibi-lidade de espécies da ictiofauna ao fogo com a abordagem sobre a percepção dos pescadores, foram observadas correspondências para algumas espécies. São elas: migradoras de maior porte (pintado) e aquelas de hábito alimentar predominantemente frugívoro, como o pacu [34][41]. Além disso, o mapeamento do território queimado foi coincidente com o observado pelos pescadores, com ambos os resultados apontando as regiões de pesca utilizadas pelas colônias de Barão de Melgaço, Miranda e Rondonópolis como as mais afetadas pelo fogo. Neste sentido, a percepção dos pescadores, tanto sobre as áreas quanto sobre as espécies afetadas, aparenta ser um bom indicador dos impactos decorrentes das queimadas.
A valorização da percepção dos ribeirinhos com relação aos efeitos do fogo ganha importância singular na conservação do bioma pantaneiro e na manutenção social dessas comunidades. Suas vivências e conhecimentos sobre o ambiente local podem contribuir para o acompanhamento dos impactos dos incêndios sobre os peixes e sobre a atividade pesqueira. Nesse sentido, o estabelecimento de protocolos de monitoramento e de desembarque pesqueiro de cunho participativo podem fornecer dados que permitam avaliar a situação das populações de peixes ao longo do tempo, ao passo que favorecem o intercâmbio de informações para a compreensão das mudanças sobre o ecossistema regional.
Conclusões
A partir da abordagem utilizada neste estudo foram identificadas como espécies mais suscetíveis aos impactos dos incêndios de 2020 duas espécies com distribuição restrita (Hyphessobrycon rutiliflavidus e Neofundulus paraguayensis), além de peixes migradores de grande porte (Pseudoplatystoma corruscans, Piaractus mesopotamicus e Zungaro jahu), que dependem da manutenção das áreas alagáveis e da conectividade hidrológica para garantir seus ciclos reprodutivos. Espécies frugívoras como o pacu (Piaractus mesopotamicus) também são afetadas pela diminuição dos recursos alimentares oriunda da perda de vegetação ripária provocada pelos incêndios.
Todos os pescadores entrevistados nas colônias de Barão de Melgaço, Miranda e Rondonópolis identificaram impactos decorrentes dos incêndios do ano de 2020 na pesca. Tal percepção coincidiu com os dados obtidos pelo mapeamento das áreas queimadas, cujos resultados apontaram para maiores proporções de área e ambientes aquáticos atingidos pelo fogo nas regiões de pesca utilizadas por pescadores das três colônias mencionadas acima. Com relação às espécies afetadas pelo fogo de acordo com a percepção dos pescadores, o pintado e as espécies com tendência à frugivoria (pacu e piraputanga) e herbivoria (piavuçu) estão entre os mais afetados.
Os impactos do fogo para a ictiofauna estão principalmente relacionados a perda e degradação do habitat, de áreas reprodutivas e a diminuição da disponibilidade de alimentos. Contudo, após um evento de alteração da paisagem, os impactos aos quais a rede fluvial está submetida se acumulam com o passar dos anos [33][42], favorecendo a degradação das bacias e resultando em impactos negativos sobre a ictiofauna, mesmo para as espécies com distribuição ampla.
A intensificação de eventos extremos, como os incêndios de 2020, são consequência não só das mudanças climáticas num contexto global, mas também das alterações locais e regionais impostas pelo uso e ocupação do solo na RHI Paraguai. O impacto dessas transformações se dará não apenas no campo da biodiversidade, mas sobre todas as populações que tradicionalmente ocupam e dependem do Pantanal para sua sobrevivência. Diante dessa situação, é importante alinhar esforços e valorizar o conhecimento da população local sobre seu ambiente, favorecendo o intercâmbio das informações necessárias para a compreensão das mudanças sobre a dinâmica ecológica da região.
Agradecimentos
Às colônias e pescadores participantes do projeto. Aos analistas ambientais Mariella Butti e Wellington Peres e ao Prof. Dr. Claumir Muniz pela disponibilidade e apoio. À SEMA-MT, IMASUL-MS e Embrapa Pantanal pelas informações fornecidas. Ao ICMBio, FUNDEP, CNPq, PIBIC e CAPES pelo suporte financeiro aos projetos de pesquisa que permitiram a realização deste estudo.
Referências
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Quadro 1 – Espécies da ictiofauna consideradas nas análises do presente estudo: espécies categorizadas como ameaçadas, quase ameaçadas e/ou de importância pesqueira na RHI Paraguai.
Nome científico |
Categoria |
Nome popular |
|
1 |
Austrolebias ephemerus Volcan & Severo-Neto, 2019 * |
Ameaçada-Em Perigo (EN): Portaria MMA 148/2022 |
Peixe-anual, killifish |
2 |
Ancistrus formoso Sabino & Trajano, 1997 * |
Ameaçada-Vulnerável (VU): Portaria MMA 148/2022 |
Cascudo-Cego |
3 |
Trichomycterus dali Rizzato, Costa, Trajano & Bichuette, 2011 * |
Ameaçada-Vulnerável (VU): Portaria MMA 148/2022 |
Bagrinho-cego-da-serra-da-bodoquena |
4 |
Pseudoplatystoma corruscans (Spix & Agassiz, 1829) |
Ameaçada-Vulnerável (VU): Portaria MMA 148/2022, pesca |
Pintado |
5 |
Hyphessobrycon rutiliflavidus Carvalho, Langeani, Miyazawa & Troy, 2008 * |
Quase ameaçada (NT): SALVE/2o ciclo |
Piabinha |
6 |
Melanorivulus dapazi (Costa, 2005) * |
Quase ameaçada (NT): SALVE/2o ciclo |
killifish |
7 |
Neofundulus paraguayensis (Eigenmann & Kennedy, 1903) * |
Quase ameaçada (NT): SALVE/2o ciclo |
Peixe-anual, killifish |
8 |
Piaractus mesopotamicus (Holmberg, 1887) |
Quase ameaçada (NT): SALVE/1º ciclo, pesca |
Pacu |
9 |
Zungaro jahu (Ihering, 1898) |
Quase ameaçada (NT): SALVE/1º ciclo, pesca |
Jaú |
10 |
Brycon hilarii (Valenciennes, 1850) |
Pesca |
Piraputanga |
11 |
Hemisorubim platyrhynchos (Valenciennes, 1840) |
Pesca |
Jurupoca |
12 |
Megaleporinus obtusidens (Valenciennes 1837) |
Pesca |
Piapara |
13 |
Megaleporinus macrocephalus (Garavello & Britski, 1988) |
Pesca |
Piavuçu, Piaussu |
14 |
Metynnis cuiaba Pavanelli, Ota & Petry, 2009 |
Pesca |
Pacupeva, pacu cd, pacu prata |
15 |
Metynnis mola Eigenmann & Kennedy, 1903 |
Pesca |
Pacupeva, pacu prata |
16 |
Myloplus levis (Eigenmann & McAtee, 1907) |
Pesca |
Pacupeva |
17 |
Pinirampus pirinampu (Spix & Agassiz, 1829) |
Pesca |
Barbado |
18 |
Prochilodus lineatus (Valenciennes, 1837) |
Pesca |
Curimba, curimbatá |
19 |
Pseudoplatystoma reticulatum Eigenmann & Eigenmann, 1889 |
Pesca |
Cachara |
20 |
Salminus brasiliensis (Cuvier, 1816) |
Pesca |
Dourado |
21 |
Sorubim lima (Bloch & Schneider, 1801) |
Pesca |
Jurupensem, Jurupecê, bagre |
*espécies com distribuição restrita
Quadro 2 – Valores de sensibilidade ao fogo obtidos para as espécies avaliadas.
Táxon |
Sensibilidade ao fogo |
Endemismo |
Hábito alimentar preferencial |
Época de desova |
Fase reprodutiva |
Densidade |
Status de conservação |
Austrolebias ephemerus |
9 |
1 |
0 |
1 |
1 |
2 |
4 |
Ancistrus formoso |
6 |
1 |
0 |
0 |
0 |
2 |
3 |
Trichomycterus dali |
6 |
1 |
0 |
0 |
0 |
2 |
3 |
Pseudoplatystoma corruscans |
7 |
0 |
1 |
1 |
1 |
1 |
3 |
Hyphessobrycon rutiliflavidus |
5 |
1 |
0 |
0 |
0 |
2 |
2 |
Melanorivulus dapazi |
6 |
1 |
0 |
0 |
1 |
2 |
2 |
Neofundulus paraguayensis |
7 |
1 |
0 |
1 |
1 |
2 |
2 |
Piaractus mesopotamicus |
5 |
0 |
1 |
1 |
1 |
0 |
2 |
Zungaru jahu |
5 |
0 |
1 |
0 |
1 |
1 |
2 |
Brycon hilarii |
3 |
0 |
1 |
1 |
1 |
0 |
0 |
Hemisorubim platyrhynchos |
2 |
0 |
1 |
0 |
0 |
1 |
0 |
Megaleporinus obtusidens |
2 |
0 |
0 |
1 |
1 |
0 |
0 |
Megaleporinus macrocephalus |
1 |
0 |
1 |
0 |
0 |
0 |
0 |
Metynnis cuiaba |
3 |
0 |
1 |
1 |
1 |
0 |
0 |
Metynnis mola |
3 |
0 |
1 |
1 |
1 |
0 |
0 |
Myloplus levis |
4 |
0 |
1 |
1 |
1 |
1 |
0 |
Pinirampus pirinampu |
3 |
0 |
1 |
1 |
1 |
0 |
0 |
Prochilodus lineatus |
2 |
0 |
0 |
1 |
1 |
0 |
0 |
Pseudoplatystoma reticulatum |
3 |
0 |
1 |
1 |
1 |
0 |
0 |
Salminus brasiliensis |
4 |
0 |
1 |
1 |
1 |
1 |
0 |
Sorubim lima |
3 |
0 |
1 |
1 |
1 |
0 |
0 |
Pesos atribuídos às características avaliadas: endemismo na Macrorregião Hidrográfica do Paraguai: sim = 1, não = 0; hábito alimentar preferencial: predadores de vertebrados, herbívoros e frugívoros = 1, predadores de invertebrados e detritívoros = 0; época de desova: no período seco = 1, fora do período seco = 0, sem período definido = 0; período reprodutivo: sobreposto parcial ou totalmente ao período seco = 1, fora do período seco = 0; densidade: rara = 2, moderada = 1, abundante = 0; status de conservação: CR = 5, EN = 4, VU = 3, NT = 2, LC = 0. Foi considerado período seco os meses de agosto a outubro [38][35].
Figura 1 – Localização das áreas de distribuição das espécies da ictiofauna avaliadas no presente estudo e das áreas queimadas no ano de ٢٠٢٠.
Figura 2 – Percentual do território e habitat da ictiofauna atingidos pelo fogo em 2020 por área de distribuição das espécies avaliadas.
Figura 3 – Variação da superfície hídrica na RHI Paraguai entre 1985 e 2021 (Fonte: Projeto MapBiomas: Mapeamento da Superfície de Água do Brasil, Coleção 2).
Figura 4 – Regiões de pesca utilizadas por cada colônia e distribuição das áreas queimadas registradas em 2020 pela plataforma MapBiomas.
Figura 5 – Percentual de área queimada e habitat da ictiofauna atingidos pelo fogo no ano de 2020 por região de pesca de cada colônia.
Figura 6 – Percentual de pescadores que afirmaram que suas áreas de pesca foram afetadas por queimadas.
Figura 7 – Espécies mais afetadas pelos incêndios de 2020 de acordo com a percepção dos pescadores entrevistados (percentual calculado a partir do total de citações). A categoria “outras” incluiu: acari, barbado, cachara, dourado, jiripoca, lambari, pacu-peva e piau.
Biodiversidade Brasileira – BioBrasil.
Fluxo Contínuo e Edição Temática:
Ecologia do Fogo e Conservação do Bioma Pantanal
n.4, 2024
http://www.icmbio.gov.br/revistaeletronica/index.php/BioBR
Biodiversidade Brasileira é uma publicação eletrônica científica do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) que tem como objetivo fomentar a discussão e a disseminação de experiências em conservação e manejo, com foco em unidades de conservação e espécies ameaçadas.
ISSN: 2236-2886